Acabo de chegar do Café.com Blog. O evento, promovido pela revista Bites, reuniu frente a frente executivos de Tecnologia de Informação de grandes empresas, empresários e outros engravatados com um interessantíssimo time de blogueiros. O evento foi interessante, mas o formato ainda pode melhorar bastante. O BlogCamp, por exemplo, foi muito mais interessante. Um evento sobre mídia social não pode começar com palestras do tipo “você fala, nós escutamos”, mesmo que as palestras tenham sido muito boas.
Depois das palestras conversei com alguns blogueiros e o clima era meio de “foi para isso que viemos aqui?” Na hora do bate-papo, o evento realmente começou a gerar algum valor, mas o tempo era muito escasso e a coisa toda ficou formal demais. Paciência, blogueiros. Uma coisa é pegar um sujeito que passa seus dias compartilhando informações no blog, no Twitter, no Facebook e jogá-lo numa desconferência. Outra é pegar o diretor de TI de uma empresa com 10.000 horas de PowerPoint no currículo e tentar fazê-lo colaborar.
Nas perguntas dos engravatados ficou claro que as empresas ainda não entenderam esse negócio todo. “Como me comunicar com blogs? Como vocês blogueiros vêem os blogs corporativos? etc.”
Bom, vamos do começo. O Edney disse no evento que começou seu site porque não aguentava mais seus amigos fazendo perguntas sobre informática. Esse é um exemplo fantástico. Um blogueiro é só isso, uma pessoa, que por qualquer motivo tem alguma coisa a dizer. Eu disse PESSOA, Pê – ê – ésse – ésse – ô – a!
Embora para o Edney seu blog possa ser um negócio, um emprego, um hobby ou qualquer outra coisa, para o resto do mundo é só isso: uma pessoa. Sabe aquele cara no seu prédio que conhece todo mundo? Conhece os vizinhos, conhece os porteiros, conhece os taxistas e o cara da padaria? O blogueiro é como esse cara, a única diferença é que um blogueiro como o Edney tem 3 milhões de vizinhos.
Imagine que você tenha um produto para vender, digamos, um desembaçador de espelho de banheiro. E vai convencer seus 10 vizinhos mais populares a falar do seu produto. Você os conhece, pessoalmente. Que estratégia você vai usar? Mandar um press-release a cada um deles? O blogueiro é como o seu vizinho. Não tem nenhuma obrigação de falar de você, e se resolver falar, não tem nenhuma obrigação de falar bem. E simplesmente não vai dar nenhuma atenção se achar que você está desperdiçando o tempo dele. Então se você não der a ele algo a respeito do qual vale a pena falar, ele simplesmente irá ignorá-lo. E se der algo muito ruim, ele pode achar que vale a pena falar mal sobre seu produto.
Quer saber de um segredo? As coisas sempre foram assim. Se você pegar os livros de marketing de 20 anos atrás vai encontrar bastante coisa sobre o poder do boca-a-boca. As pessoas sempre procuraram informações com o vizinho, com um amigo ou parente antes de comprar. O que acontecia de diferente é que no passado nem sempre o sujeito encontrava um amigo ou parente que possuía ou sequer se interessava pelos produtos que ele queria comprar. Era o caso do sujeito que queria uma boa máquina fotográfica, mas não tinha absolutamente ninguém próximo que entendesse de fotografia. Hoje, no melhor estilo long tail, você vai encontrar na web gente apaixonada por aquilo que é do seu interesse, sejam bromélias, espeleologia ou computação analógica.
Então vamos às perguntas
Como me comunicar com blogs?
Exatamente como com o seu vizinho. Como uma pessoa. Não tenho tempo de ouvir a ACME.com, mas a coisa vai ser diferente se o Marcelo, que é um cara muito legal, bem-humorado e inteligente, leitor do meu blog e de uma série de outros, e que por um acaso trabalha na ACME.com, tomar seu tempo para me escrever algo genial, que vale a pena ser passado adiante.
Ligue para o setor de atendimento de qualquer grande empresa de tecnologia para perguntar sobre um novo modelo de computador. Um que seja 0800, para que você não gaste seu dinheiro à toa. Preste atenção em como eles falam. Agora ligue para um bom amigo que trabalha na área, para pedir indicações de, sei lá, que computador comprar. Veja como ele fala.
Percebeu a diferença? Os caras do “Manifesto Cluetrain” dizem:
Conversações entre seres humanos parecem humanas. Elas são conduzidas em uma voz humana. As pessoas se reconhecem como tal pelo som desta voz.
Quer seja explicando ou reclamando, brincando ou séria, a voz humana é genuína. Ela não pode ser falsificada.
A vida corporativa nos ensina a vestir fantasias. Uma mãe de três filhos divorciada, dona-de-casa por opção, cinéfila, ciclista e artesã veste todas as manhãs sua fantasia de diretora executiva de multinacional. Lá ela não fala sobre seus filhos ou a última pedalada. Ela não conta piadas nem fala abertamente o que pensa como faz fora da empresa. Sua voz deixa de ser humana. É assim que as empresas estão falando com seus clientes, e é assim que estão tentando falar com os blogueiros.
Como vocês blogueiros vêem os blogs corporativos?
Depende. O que exatamente você chama de “blog corporativo“?
Tenho um amigo que trabalha na Microsoft. Sou usuário de Linux e, que me lembre, não uso atualmente nenhum produto da Microsoft. Mas, graças a nossas conversas (presenciais, não em blogs) sei bastante coisa sobre o que a empresa anda fazendo hoje em dia, inclusive algumas soluções muito, muito interessantes. Estou até propenso a escrever sobre algumas coisas.
Por que meu amigo conseguiu me falar dessas coisas todas? Porque ele é humano. Porque se eu digo que determinado produto não presta ele não responde com um “estamos fazendo o melhor para atendê-lo” ou qualquer outra coisa assim.
Quer ver só? Acesse o blog do Rexona. Você vai perceber que é só um clipping de notícias com um sistema de comentários. Não foi escrito por uma pessoa, foi escrito talvez por uma empresa, um frasco de desodorante ou quem sabe um atendente de telemarketing. A voz das pessoas é diferente daquilo. Pessoas tem um nome. “Rexona” não é nome de gente. Pessoas emitem opinião. Às vezes, até são engraçadas.
Os blogs não podem salvar seu produto ruim.
Tenho falado mal da Telefonica aqui neste blog. Atendem mal, e me deixaram de fora do Google CodeJam. Já falo mal deles há uns cinco anos, e esse site, por exemplo, está no ar há seis.
Se você fizer uma busca simples, vai descobrir que as reclamações são constantes. A qualidade do serviço e do atendimento não mudou nada nesses seis anos. O que você acha que as pessoas estão falando por aí, fora da internet, sobre a Telefônica? Converse com seus vizinhos. Não há nada que a Telefônica possa fazer para que eu e milhares de outros blogueiros falemos bem dela, a não ser melhorar o serviço.
Esta semana precisei novamente deles. Perdi horas ao telefone. Não é uma hipérbole, perdi horas literalmente. Se for falar da Telefônica, o que você acha que eu vou dizer?
Produto é marketing
Homens de marketing, o trabalho de vocês tem mais a ver com operações, atendimento e a própria criação do produto. Voltem aos seus velhos manuais de marketing da faculdade, e vocês vão ver que tudo isso está lá dentro, esquecido. Criar o produto, dizer como ele deve ser, é uma atividade de marketing.
Você precisa de um produto que as pessoas, ao ver, pensem: “Uau! Preciso contar isso para alguém.” Pense no Skype, no iPod, no Nintendo Wii, no Gmail, no TiVo. Simplesmente não dá mais para falsificar isso, porque estamos todos conectados.